segunda-feira, 23 de junho de 2014

Estranho seria se eu não me apaixonasse por você...




Bagagens atrás da porta.
Desfez os laços que insistiam em amarrar os seus pés no chão.
Sabia voar, mas tinha medo. 
O peso da alma pesava no vento.
Era feita de instante, passagem, momento.
Não descobriu sozinha o quão confortável pode ser caminhar junto, lhe mostraram.
Abriu a porta e mostrou o caminho certo a seguir.
Involuntariamente, seus pés a seguiram.
O medo segurou sua mão, perdeu a conta de quantas vezes.
Tentou agarrar-se a algo seguro, mas a segurança corria de seu alcance.
Olhou as suas janelas e viu o quanto de coisas elas diziam.
Permitiu-se.
Aprendeu a permitir.
Acreditou.
Se surpreendeu.
Pegou-se no instante do fechar dos olhos.
Os olhos que fecha pra sentir que pertence à alguém.
Nunca foi dona do terreno que pisou. 
Nunca foi parte de si mesma. 
Era uma completa estranha dentro de seu próprio sopro de ser.
Foi sacudida, tocada, sentida.
Foi por parte, por metade, por inteira.
Pediu para o tempo parar.
Parou.
Ela parou.
O tempo continuou a correr.
Plantou outras flores, cultivadora que é.
Volta a fechar os olhos...
Ah! se pudessem ver o sorriso bobo que ela esconde no rosto.
Qualquer um pode notar ao olhar em suas janelas.
As janelas que dizem aquele tanto de coisas.
As dela dizem demais. Recebe também.
Ela. Ela.
Fragmentos compartilhados.
Deixou o medo pra depois.
Sem resistir, permitiu

...

Ela é a metade de dois.


23.06.2014 19:52



Noite.
A janela está aberta.


O vento entra leve e sussurra a saudade que eu gosto de sentir.
O silêncio puxa a cadeira e senta ao meu lado. Lembranças me abraçam com braços de querer.
O querer que deu nome às flores que deixei pelo caminho. Sortuda que sou, são todas flores fictícias, dessas que não se vão nem que o vento leve. O vento que não leva. O mesmo que sempre traz.
O vento leve que de leve, nada tem. Esse que pesa, pisa, envaidece. Sou bom colecionador.
De longa data, coleciono flores - fictícias - banhadas dessa que sem mãos nos bate a face.
Essa, que os sábios denominaram como saudade. Essa que repito o nome, tornando cansativo todo o escrito. 
Sim, eu me repito. Nesse vento leve que me leva, eu me permito. Que bons ventos lhe trouxeram? Saberei? 
Ligeiro, tão louco e confuso... Permite. Bons ventos que trouxeram, permita que fique?
Ficando de pouco em pedaços, fiquei. Tão fácil pode ser doar fragmentos de si por aí...
Difícil é uni-los de volta. Que bons ares levam tão longe a realidade? Que boba felicidade volta a bater na porta? 
Sem precisar de muitas batidas, esse que de leve nada tem, a abre. Entra, senta, me observa.
Cheiro de flor de mentira, não quero sentir. Se não se tratar de bons ventos, seja certo o arrependimento, mais 
um fragmento a dividir. Quem partilha muito de si, sempre volta com bagagem.
Sou a mistura de mim mesmo e das fictícias flores que colhi? Sou eu o continuar da criação dessas?
Sou quem as rega daquilo que me torna uma repetição? Ela continua sentada a me observar.
Eu fugiria desse azul todo que escorrega de suas janelas. Eu fugiria, se ainda pudesse.
Não me pergunte a razão que me prende, eu não saberia lhe responder e, em sigilo, odeio a ausência da 
resposta. Venha, fique, permite. Me observe, não venha leve, mude as entrelinhas, não sejas breve. 
Confessar é o meu risco. Escapando dos segredos, com o seu observar barato, tão pouco é preciso 
dizer quando tudo em silêncio é falado. Sou meu. Não somente meu. Em segredo, sou das flores também. 
Sou os fragmentos que deixei, a fantasia que vesti, e essa repetição que permito.

Sou o cansar desse escrito.

27.05.2014